Há mais indígenas em São
Paulo do que no Pará ou no Maranhão. O número de indígenas que moram em áreas
urbanas brasileiras está diminuindo, mas crescendo em aldeias e no campo. O
percentual de índios que falam uma língua nativa é seis vezes maior entre os
que moram em terras indígenas do que entre os que vivem em cidades.
As conclusões integram o
mais detalhado estudo já feito pelo IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e
Estatística) sobre os povos indígenas brasileiros, baseado no Censo de 2010 e
lançado no inicio do mês de junho (2017).
Segundo o instituto, há
cerca de 900 mil índios no Brasil, que se dividem entre 305 etnias e falam ao
menos 274 línguas. Os dados fazem do Brasil um dos países com maior diversidade
sociocultural do planeta. Em comparação, em todo o continente europeu, há cerca
de 140 línguas autóctones, segundo um estudo publicado em 2011 pelo Instituto
de História Europeia.
No “Caderno Temático:
Populações Indígenas”, o IBGE faz um mapeamento inédito sobre a localização
desses povos e sua movimentação ao longo das últimas décadas.
O estudo diz que, entre 2000
e 2010, os percentuais de indígenas brasileiros que vivem nas regiões Sul e
Sudeste caíram, enquanto cresceram nas outras regiões. A região Norte abriga a
maior parcela de índios brasileiros (37,4%), seguida pelo Nordeste (25,5%),
Centro-Oeste (16%), Sudeste (12%) e Sul (9,2%).
Entre 2000 e 2010, também
caiu o percentual de indígenas que moram em áreas urbanas, movimento contrário
ao do restante da população nacional.
Segundo a pesquisadora do
IBGE Nilza Pereira, autora do texto que acompanha o estudo, uma das hipóteses
para a redução no percentual de indígenas no Sul, Sudeste e em cidades são os
movimentos de retorno a terras tradicionais.
Nas últimas décadas, intensificaram-se
no país as chamadas “retomadas”, quando indígenas retornam às regiões de origem
e reivindicam a demarcação desses territórios. Em alguns pontos, como no
Nordeste e em Mato Grosso do Sul, muitos ainda aguardam a regularização das
áreas, em processos conflituosos e contestados judicialmente. Em outros casos,
indígenas podem ter retornado a terras que tiveram sua demarcação concluída.
Hoje 57,7% dos índios brasileiros vivem em terras indígenas.
Outra possibilidade, segundo
Pereira, é que no Sul, Sudeste e nas cidades muitas pessoas que se declaravam
como indígenas tenham deixado de fazê-lo. Ainda que sua população indígena
esteja em declínio, a cidade de São Paulo ocupa o quarto lugar na lista de
municípios brasileiros com mais índios, com 13 mil. Parte do grupo vive em
aldeias dos povos Guarani Mbya nos arredores da cidade, em territórios ainda em
processo de demarcação.
O ranking é encabeçado por
São Gabriel da Cachoeira, no noroeste do Amazonas. O município abriga 29 mil
indígenas e foi o primeiro do país a aprovar como línguas oficiais, além do
português, três idiomas nativos (tukano, baniwa e nheengatu).
O estudo mostra como morar
numa terra indígena influencia os indicadores socioculturais dos povos. Entre
os índios que residem nessas áreas, 57,3% falam ao menos uma língua nativa,
índice que cai para 9,7% entre indígenas que moram em cidades.
Mesmo no Sul, região de
intensa colonização e ocupação territorial, 67,5% dos índios que vivem em
terras indígenas falam uma língua nativa, número só inferior ao da região
Centro-Oeste (72,4%).
A taxa de fecundidade entre
mulheres que moram em terras indígenas também é significativamente maior que
entre as que vivem em cidades. Em terras indígenas, há 74 crianças de 0 a 4
anos para cada 100 mulheres, enquanto nas cidades há apenas 20.
Para Nilza Pereira, do IBGE,
ao mostrar detalhes sobre indígenas de diferentes pontos do país, o estudo será
útil para o planejamento de políticas públicas diferenciadas para esses povos.
Os dados também foram usados na elaboração de vários mapas, que compõem o
“Atlas Nacional do Brasil Milton Santos”.
Cultura indígena
O ativista indígena Denilson
Baniwa, cofundador da Rádio Yandê, diz à BBC Brasil que o estudo ajuda a
combater a falta de conhecimento sobre os povos indígenas no Brasil.
Baniwa, que mora no Rio de
Janeiro e é publicitário, diz se deparar frequentemente com pessoas que acham
que “o indígena ainda é aquele de 1500”. Segundo o ativista, muitos questionam
por que ele se considera indígena mesmo falando português ou usando o
computador em seu trabalho.
“Respondo que cultura não é
algo estático, que ela vai se adaptando com o tempo. E pergunto a eles por que
não vestem as mesmas roupas usadas pelos portugueses em 1500, por que não falam
aquele mesmo português e por que não usam computadores de 1995.”
Para Baniwa, há ainda grande
desconhecimento sobre as enormes diferenças culturais entre os povos indígenas
brasileiros. Ele exemplifica citando dois povos de sua terra natal (a região do
rio Negro, no Amazonas), os baniwa e os tukano.
“Comparar um baniwa a um
tukano é como comparar um francês a um japonês. São povos com línguas, hábitos
e características físicas bastantes distintas, e isso porque vivem bem
próximos. Imagine a diferença entre um baniwa e um kaingang, um povo lá do Rio
Grande do Sul?”
Ao mesmo tempo em que
combate o preconceito contra indígenas que, como ele, moram em cidades, Baniwa
afirma que cada povo deve ser livre para decidir como quer se relacionar com o
resto da sociedade.
“Se um povo entender que o
contato com o mundo moderno não será benéfico e que prefere ficar mais isolado
em sua terra, vamos lutar para que essa decisão seja respeitada.”
https://www.revistaprosaversoearte.com/305-etnias-e-274-linguas-estudo-revela-riqueza-cultural-entre-indios-no-brasil/?fbclid=IwAR3jyk7g9Jj-SeG5wy3ybKB3SNo34eGXj9S_ID4tO6PV_nezanpx-p_XwYg
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